Membresia de Igreja é Bíblico?
Matt Chandler
“A esposa de Cristo não pode ser adúltera; ela é imaculada e pura. Ela
conhece apenas um lar; ela protege com casta modéstia a santidade de um único
leito. Ela nos guarda para Deus. Ela aponta para o reino os filhos que gerou.
Qualquer um que se separe da Igreja e se junte a uma adúltera está separado das
promessas da Igreja; tampouco aquele que abandona a Igreja de Cristo pode
alcançar as recompensas de Cristo. Ele é um estranho; é um profano; é um
inimigo. Ele não pode ter Deus por seu Pai, eis que não tem a Igreja por sua
mãe.” - Cipriano, Tratado sobre a Unidade da Igreja, 6.
Eu tinha 28 anos quando me tornei pastor da Highland Village First
Baptist Church (agora conhecida como The Village Church). Eu havia tido uma
situação difícil no início da minha experiência com a igreja e, naquele
período, eu ainda não havia saído completamente da minha fase de
“desencantamento com a igreja local”.
Com toda a honestidade, eu não estava certo, naquele período, de que
membresia de igreja era algo bíblico. Apesar disso, o Espírito havia tornado
claro demais que eu haveria de pastorear essa pequena igreja nos arredores de
Dallas. Essa foi uma das muitas ironias da minha vida naqueles dias.
A Highland Village First Baptist Church era uma igreja “sensível ao
visitante”, nos moldes da Willow Creek Community Church [N.T.: megaigreja
norte-americana fundada pelo pastor Bill Hybels, considerado junto com Rick
Warren o pai do movimento “sensível ao visitante” (seeker-sensitive)], e sem qualquer processo
formal de membresia, embora ela estivesse ativamente elaborando um e desejasse
a participação do novo pastor. Eu possuía um entendimento robusto acerca da
igreja universal, mas não era muito versado - e, como disse, um tanto cético -
no tocante à igreja local. Nós começamos a crescer rapidamente com jovens de 20
e poucos anos e frequentemente insatisfeitos, os quais geralmente não possuíam
nenhuma experiência anterior de igreja, ou possuíam experiências ruins. Eles
gostavam da The Village porque nós éramos “diferentes”. Isso sempre me chocava
porque nós não estávamos fazendo nada exceto pregar e cantar.
Em conversas com esses homens e mulheres, eu comecei a ouvir coisas
como: “A igreja é corrompida; é tudo sobre dinheiro e o ego do pastor” ou: “Eu
amo Jesus; o meu problema é com a igreja”. A minha favorita era: “Quando você
organiza a igreja, ela perde o seu poder”. Embora alguma coisa às vezes
ressoasse em mim com tais comentários (eu, juntamente com a maior parte da
minha geração, tinha problemas com autoridade e compromisso), eu os considerava
confusos uma vez que eles estavam sendo feitos a mim por pessoas que estavam
frequentando a igreja da qual eu era o pastor.
Duas Questões de Hebreus 13.17
Em meio à efervescência de conflitos sobre outras doutrinas que eu
considerava muito mais centrais, eu me questionava se nós deveríamos deixar
essa coisa de membresia de igreja de lado e voltar a ela depois. Naquele tempo,
eu estava me preparando para pregar ao longo do livro de Hebreus e “aconteceu”
de eu estar no capítulo 13 quando o versículo 17 saltou da página: “Obedecei
aos vossos guias e sede submissos para com eles; pois velam por vossa alma,
como quem deve prestar contas, para que façam isto com alegria e não gemendo;
porque isto não aproveita a vós outros”.
Duas questões me ocorreram. Primeiro, se não há qualquer exigência
bíblica de pertencer a uma igreja local, então a quais líderes deveria um
cristão individual obedecer e se submeter? Segundo, e mais pessoalmente, por
quem eu, como pastor, haveria de prestar contas?
Essas duas questões despertaram minha busca por um entendimento bíblico
da igreja local, e elas começaram em torno das ideias de autoridade e
submissão.
No tocante à primeira questão, as Escrituras claramente ordenam que os
cristãos se submetam e honrem um corpo de presbíteros (Hb 13.17; 1Tm 5.17). Se
não há qualquer entendimento acerca da membresia da igreja local, então a quem
devemos nos submeter e obedecer? Será que devemos fazê-lo a qualquer um com o
título de “presbítero” de qualquer igreja? Deveria você, como cristão, obedecer
àqueles loucos da Westboro Baptist [igreja norte-americana amplamente descrita
como um grupo de ódio]? Para obedecer a Escritura, você deve fazer piquetes em
funerais de soldados, como o pastor de Westboro parece sugerir?
No tocante à segunda questão, as Escrituras claramente ordenam que um
corpo de presbíteros cuide de um povo específico (1Pe 5.1-5; também At
20.29-30). Acaso eu, como pastor, serei considerado responsável por todos os
cristãos na região metropolitana de Dallas? Há muitas igrejas em Dallas com as
quais possuo fortes discordâncias teológicas e filosóficas. Acaso eu prestarei
contas pelo que elas ensinam em seus grupos pequenos, por como elas gastam seu
dinheiro, e pelo que elas fazem em relação a missões internacionais?
O que Dizer da Disciplina Eclesiástica?
Após considerar questões de autoridade e submissão, o segundo problema
que surgiu no meu estudo da igreja local foi o ensinamento bíblico acerca da
disciplina eclesiástica.
Você a vê em diversos lugares, mas em nenhum tão claramente quanto em
1Coríntios 5.1-12. Nesse texto, Paulo confornta a igreja em Corinto por aprovar
um homem que andava em imoralidade sexual escancarada e impenitente. Os
coríntios estão celebrando isso como a graça de Deus, mas Paulo os alerta que
esse tipo de impiedade não deveria deixá-los orgulhosos, e sim fazê-los
lamentar. Ele os chama de arrogantes e os diz que removam esse homem para a
destruição da sua carne e, esperançosamente, para a salvação da sua alma. No
versículos 11-12, ele não usa meias palavras: “Mas, agora, vos escrevo que não
vos associeis com alguém que, dizendo-se irmão, for impuro, ou avarento, ou
idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com esse tal, nem ainda
comais. Pois com que direito haveria eu de julgar os de fora? Não julgais vós
os de dentro?”.
A minha triste experiência mostra que pouquíssimas igrejas ainda
praticam a disciplina eclesiástica, mas esse é um outro artigo para um outro
dia. A questão que emerge dessa passagem é simples: como você pode pode colocar
alguém “para fora” se não existe um “dentro”? Se não existe qualquer comprometimento
local com uma comunidade pactual de fé, então como você remove alguém dessa
comunidade de fé? A disciplina de igreja não funciona se a membresia da igreja
local não existe.
Muitas Outras Evidências em Favor da Membresia
Há outras evidências nas Escrituras que dão suporte à membresia da
igreja local.
Nós vemos em Atos 2.37-47 que havia um registro numérico daqueles que
professavam Cristo e eram cheios do Espírito Santo (v. 41), bem como um
reconhecimento de que a igreja estava crescendo (v. 47).
Em Atos 6.1-6, nós vemos eleições serem realizadas a fim de lidar com um
problema e uma acusação específicos.
Em Romanos 16.1-16, nós vemos o que parece ser uma consciência de quem é
membro da igreja.
Em 1Timóteo 5.3-16, nós vemos um claro ensino acerca de como lidar com
as viúvas na igreja e, nos versículos 9-13, nós lemos isto:
Não seja inscrita senão viúva que conte ao menos sessenta anos de idade,
tenha sido esposa de um só marido, seja recomendada pelo testemunho de boas
obras, tenha criado filhos, exercitado hospitalidade, lavado os pés aos santos,
socorrido a atribulados, se viveu na prática zelosa de toda boa obra. Mas
rejeita viúvas mais novas, porque, quando se tornam levianas contra Cristo, querem
casar-se, tornando-se condenáveis por anularem o seu primeiro compromisso. Além
do mais, aprendem também a viver ociosas, andando de casa em casa; e não
somente ociosas, mas ainda tagarelas e intrigantes, falando o que não devem.
Nesse texto, nós vemos critérios para quem seria e quem não seria
qualificado para o programa de cuidado com as viúvas de Éfeso. A igreja local
em Éfeso é organizada, e eles estão executando um plano.
Nós podemos seguir mais e mais aqui, fazendo perguntas sobre como
podemos ser obedientes aos mandamentos de Deus em 1Coríntios 12 ou Romanos 12
se não estivermos conectados a uma comunidade local e pactual de fé. Mas expor
todos os textos possíveis iria requerer mais tempo do que eu disponho para este
artigo.
O Plano de Deus é que Pertençamos a Igrejas Locais
Quando você começa a olhar para esses textos, torna-se claro que o plano
de Deus para a sua igreja é que nós pertençamos a uma comunidade local e
pactual de fé. Isso é para a nossa própria proteção e amadurecimento, e para o
bem dos outros.
Se você enxerga a igreja como uma espécie de buffet eclesiológico, então você severamente
limita as possibilidades do seu crescimento em maturidade. Crescer em piedade
pode machucar. Por exemplo, à medida que eu interajo com outros em meu próprio
corpo local, minha indolência no zelo é exposta, assim como minha falta de
paciência, minha falta de oração e minha hesitação em associar-me aos mais
fracos (Rm 12.11-16). Contudo, essa interação também me dá a oportunidade de
ser amorosamente confrontado por irmãos e irmãs que estão nas trincheiras
comigo, assim como me fornece um lugar seguro para a confissão e o
arrependimento. Mas, quando a igreja é apenas um local que você frequenta sem
de fato ligar-se a ela, como um buffet eclesiológico,
seria preciso apenas considerar por que você está sempre mudando a cada vez que
o seu coração começa a se expor ao Espírito e a verdadeira obra está começando
a acontecer.
Qual é o cerne de tudo isso? Membresia de igreja local é uma questão de
obediência bíblica, não de preferência pessoal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário